REVISÃO DA MULTA CONTRATUAL

Dr. Thiago Giacon

Em sentido amplo, multa ou também denominada de cláusula penal, é a sanção aplicada a alguém que infringe a lei, o contrato ou decisão judicial. O objetivo da multa é obrigar o devedor a cumprir a obrigação.

A multa pode ser tanto compensatória como moratória. A multa compensatória é uma indenização pelo descumprimento do contrato e a multa moratória é a multa pelo atraso. Ambos os tipos de multas têm as suas limitações, como por exemplo, o Código de Defesa do Consumidor que estipula o limite de 2% (dois por cento) para as obrigações de consumo, cuja análise não será aprofundada neste artigo.

A regra geral está prevista no Código Civil, que em seu artigo 412 reza que o valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o valor principal da obrigação:

“Art. 412. O valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal.”

A ilustre professora doutora Maria Helena Diniz ensina que “se o valor da penalidade for manifestamente excessivo, em face da natureza e da finalidade do negócio e ainda que dentro dos limites do Art. 412, poderá o juiz, de ofício, determinar a redução. Essa regra não estava presente no Código Civil de 1916 e representa considerável inovação, afastando, completamente, o princípio da imutabilidade da cláusula penal. ”1

Se de livre decisão as partes decidiram incluir uma multa abaixo do limite legal previsto no artigo 412 do Código Civil, por que o juiz poderá revisar essa multa?

A Constituição Federal estabelece no artigo 3º, caput, inciso I que um dos objetivos da República Federativa do Brasil é “construir uma sociedade livre, justa e solidária”. Desta forma a justiça e a solidariedade estão entre os objetivos fundamentais do Estado. Os valores e princípios que regem a Constituição Federal de 1988 foram gradativamente mitigando o individualismo do contrato para que o sistema se preocupe com a dignidade da pessoa humana.

Neste contexto o artigo 413 do Código Civil estabelece que o juiz deve reduzir a cláusula penal equitativamente se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte ou for manifestadamente excessiva:

“Art. 413. A penalidade deve ser reduzida eqüitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio.”

Interessante analisar que no Código Civil de 1916, em artigo semelhante, era utilizada a palavra “poderá”, facultando ao juiz a revisão, enquanto que, no atual Código Civil de 2002 a palavra foi substituída por “deve”, razão pela qual se trata de norma cogente, ou seja, obrigatória.

A redução da multa deve ser analisada caso a caso, mediante análise equitativa do juiz. Importante destacar que não se trata apenas de uma redução de proporcionalidade matemática e sim de equidade (enunciado nº 359 do Conselho da Justiça Federal – CJF). A redução equitativa não é sinônimo de redução proporcional.

Essa noção de equidade, segundo a ideia de Aristóteles, é a justiça no caso concreto. Enquanto a justiça em si é medida abstrata, suscetível de aplicação a todas as hipóteses, a equidade é a justiça no ajustamento do caso concreto.

Miguel Reale ensinou em suas Lições Preliminares do Direito2

“Há certos casos em que a aplicação rigorosa do Direito redundaria em ato profundamente injusto. Summum jus, summa injuria. Esta afirmação, para nós, é uma das mais belas, e profundas da jurisprudência romana, porque ela nos pôe em evidência a nocão fundamental de que o direito não é apenas sistema lógico-formal, mas, sobretudo, a apreciação estimativa ou axiológica da conduta.”.

Assim, o juiz deve considerar a intenção dos contratantes, a gravidade da infração, a culpa do devedor, a má-fé, as vantagens do inadimplemento, o interesse do credor na prestação, a situação econômica de ambas as partes, as condições em que foi negociado, entre outras coisas.

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